Às vezes o mar demora a entrar em nós. Há que saber chamá-lo, cantar-lhe uma canção, baixinho, mas num volume suficiente para que lhe afaste a timidez e as ondas cheguem aos nossos pés. Depois ultrapassa-nos, é o nosso corpo que corre ao seu encontro para nele mergulhar.
Confesso que a entrada no mar de Banville não foi de todo fácil ou bem-vinda. Havia expectativas e uma ideia de história já criada na minha cabeça. Queria ser afogada nas suas palavras, fosse de que maneira fosse. Queria ser impressionada. Mas o mar não se deixa impressionar assim, por mera vontade.
Nesta obra, a costa retratada por um narrador de meia-idade, Max Molden, é um local que apela a recordações passadas onde a sua infância foi, durante uns quantos verões, palco de inúmeras descobertas mas também de alguns segredos, portas entreabertas para uma terrível tragédia que irá modificar a vida de todos aqueles por ela tocados, incluindo a de Max.
Após a morte da sua esposa, vencida ao cancro, Max regressa à vila costeira para fazer o seu luto e, com 'sorte' - considera ele -, também a sua própria despedida. É perto desse mar que Max nos conta as memórias que ainda retém do lugar e das pessoas que marcaram a sua vida nessa fase e, possivelmente, em todas as seguintes. É uma viagem feita ao ritmo de marés, por vezes traiçoeiras mas noutras, misericordiosas. Max reflecte sobre o impacto que uma família e os seus filhos gémeos tiveram em si e como, querendo ou não, podemos ser mais influenciados por quem já partiu do que por quem ainda permanece. O narrador acaba, assim, por lidar com as suas próprias noções de presença, o que será que resta quando tudo parte? E em muitos momentos batalha por manter perto o que já há muito não está ao seu alcance. Ancorado no fundo, talvez. Entre lembranças desses verões distantes e dos tempos de luta contra o cancro da esposa, Max tece uma forte ligação entre ambas para chegar a uma compreensão do homem que encontra em si, recolhendo do passado uma absolvição para o seu presente.
The Sea pode, a determinadas alturas, tornar-se uma leitura menos fácil mas não deixa de cativar e uma coisa é certa: quando nela mergulhados, a última coisa que se quer é de lá sair.
« Memory dislikes motion, preferring to hold things still (…) »
. The Sea